quarta-feira, junho 30, 2004

#7 *Diamantes

Acordei com uma preciosidade. No bolso da mente estava impregnado um diamante. Cravado neste sujeito, ainda lhe sentia o sabor e o brilho. Insalubre mas cintilante, a memória de uma dormida permanecia prudentemente relembrada. Quem serias tu para me acusares, de calculista. O diamante mostrou-me a minha inconsequência a minha marca pessoal, o meu arriscar viver a vida, mas o teu sabor, esse não é real. E a que sabes tu? Água de coco, sumo tropical, feijão com arroz? Ah, como era bom o teu sabor do qual não me recordo. Ah, como são bons os sonhos de um jovem. Sonho. Não és objectivo.
O teu sorriso, esse sim brilha como diamante, o teu andar sensual, qual dançarina frenética me conduz. Não és o meu pequeno-almoço. Quando os olhos se abrem o inquebrável diamante, dói-me na garganta. De volta ao paralelepipédico colchão, nem me consigo mexer, apetece-me gemer, de dor, mas as cordas não vibram.
Volto a fechá-los num gesto infantil de quem espera diamantes eternos. Mas tudo o que tem o seu valor e pode ser usado, já o foi. E a lembrança torna-se, em esperança, daquilo que virá depois de amanhã durante o Luar.

sexta-feira, junho 11, 2004

#6 *Atrasos

Foi de manhã, quinta-feira, 3 de Junho. O cansaço habitual deixou-me estatelado entre o colchão e uma mistura de roupa suja com lençóis transpirados. Adivinhava-se mais um atraso. Mas este carregado de necessidade de não ter acontecido, teve o seu quê de utilidade. Dormi mais, e pouco já era. A cabeça já se agitava, sexta-feira voltava o festival. Estava extasiado com a possibilidade de descansar o suficiente, conseguindo assim manter a forma. Estava também repleto de curiosidade pela cidade rock.
Sempre que nos achamos nestas situações tudo o que não queremos são atrasos. Mas quinta-feira, ainda cansado atrasei-me, de noite. Deixei passar a hora que me levava a dormir, deixei a noite tomar-me por seu companheiro, cúmplice, qual despertador que ataca os que de insónias sofrem. Mas desta vez, eu era o atacante e o lesado. Eu era não o masoquista consciente que sexta-feira de manhã, o pequeno-almoço iria ser dor. Pode doer quando nos magoam, consciente ou inconscientemente. Mas acho que isso nada é comparado com tudo aquilo que nos envolve e só a nós, num turbilhão de autoconfiança, a auto estima, quando estas se deixam de definir e começam-nos a maltratar, qual hipócrita que outrora o sorriso nos oferecia e agora mostra-nos que, pelas suas mãos, a tormenta pode ser uma constante.

quinta-feira, junho 03, 2004

#5 *Referencial

A manhã que já foi, a manhã que já vem, toda ela recheada de gula. A gula, ou a fome, dependem do referencial. De madrugada, a fome, agora! De manhã o enjoo, da gula madrugadora. Ao almoço falta de fome da gula das entradas. O lanche? Gula da fome de não ter almoçado. Gula, um gelado, gula dois gelados, fome que eles não matam.
Chega a pastilha, há quem a trate por chicla! O suco, que a cada mascadela, corrói as paredes estomacais não é mais que um prolongamento da fome, não é mais que a auto-destrutiva gula! A gula da pastilha doce, se for de limão amarga, amarga tudo menos a gula. Quando pouco ou nada durmo, não tenho refeições, menos que o habitual, corrijo. Nulas, chego mesmo a exclamar! E a fome e a gula são então uma só e só dependem do referencial.

terça-feira, junho 01, 2004

#4 *Ácaro

Hoje o pequeno-almoço foi no comboio. Não porque tenha comido qualquer coisa lá. A má disposição já habitual, aliou-se a um prolongamento da noite, isto é, dormi, enjoado.
Acordei, enjoado. O pequeno-almoço no comboio: pessoas; angústias; desrespeitos. Vontade de chegar primeiro, ao dolce far niente, vulgo trabalho.
Alguns, cujo suor matinal teima em revelar o dia anterior, o lavor, o vexame, olham envergonhados de tamanha pobreza de espírito.
Como de repente os possuo e me alimento de tudo aquilo.
Talvez por isso, volto a fechar os olhos e permaneço mais alguns minutos até dar a primeira dentada nos restos da pele do padeiro, qual ácaro